domingo, 14 de maio de 2017

G R A T I D Ã O



    Parabéns, vocês me fizeram chorar o dia todo.
    Senti necessidade de vir até aqui desaguar o que passa no meu coração. A gratidão que eu to sentindo não tá nem cabendo no peito. Desde a hora que acordei eu não consegui parar de chorar. Confesso que ando uma casca de ovo e, como diz a minha mãe, se me der um olhar mais firme eu já me desfaço em lágrimas. Mas hoje não é sobre isso.
    Há 22 anos atrás eu nascia, também no dia das mães, a coincidência desse evento que acontece tão raramente é parte do que me faz querer abraçar o mundo. Eu sou muito grata por tudo. Eu sou muito reclamona, isso é verdade, e a impermanência e insatisfação constante com minha própria existência como ser humano me torna insuportável de se conviver em alguns dias. Mas hoje eu tiro o dia para única e exclusivamente agradecer.
    A primeira coisa pela qual sou grata é a mãe que tenho. De longe é a mulher mais forte, incrível, fantástica e empática desse mundo. Mamãe, embora muitas vezes você se questione onde errou com seus filhos, eu só vejo perfeição em tudo o que você faz. Obrigada por me entender como mãe, como amiga e confidente. Acima de tudo, obrigada por ter feito com que eu aceitasse e soubesse lidar tão bem com meus próprios demônios, por ter me ensinado a lutar contra minha própria cabeça que insiste em me arrastar para o fundo e, por fim, por ter feito eu enxergar que as minhas dificuldades fazem de mim uma pessoa melhor. Hoje eu vejo o mundo de tantas perspectivas diferentes, sou inundada por tanto amor e compaixão que desconheço sentimentos como ódio, raiva, rancor. Feliz dia das mamães!
    Agradeço meu pai, por ter sido o maior exemplo da minha vida de volta por cima, de mudança, resiliência e resistência. Por hoje ser um pai presente, carinhoso, amável e querido. Por cuidar de mim, mesmo que não entenda sempre as minhas maluquices ou os meus desvios de conduta. Você é um pai maravilhoso e eu morro de orgulho de quem você é, mesmo que suas piadas sejam extremamente ruins e que você seja exageradamente teimoso.
           Aos amigos, suspiro. Nunca fui de ter muitos amigos. Eu nunca fui uma criança ou uma adolescente popular. Pelo contrário, eu tive inúmeras decepções com amizades que eu jurava ser pra vida inteira. Nem nos meus sonhos mais ambiciosos, eu poderia imaginar que encontraria amigos tão maravilhosos que carrego e vou carregar pra vida toda. Vocês são a minha alma-gêmea, meus amores pra vida toda, as grandes paixões da minha vida. Vocês estão acima de qualquer coisa. Namorados, faculdade, trabalho. Eu não penso duas vezes antes de ir quando vocês precisam. 'Cês não tem ideia do tanto que eu amo vocês e que em mim, vocês encontram a escudeira mais leal, fiel e protetora. Eu vou defender vocês e todas as suas falhas e defeitos até a morte. Vou chacoalhar cada um toda vez que bater uma maré de bad e vou mandar memes sempre que vocês estiverem tristes. Obrigada por cada ombro, colo, grana emprestada, rolê bão, rolê ruim, cerveja, suquinho, pizza, sushi e abraço. Obrigada por cuidarem de mim quando muitas vezes eu não conseguia fazer isso sozinha. Seguramos muitas barras juntos e vamos segurar ainda mais, com certeza. Aqui eu jogo todo o meu amor por vocês.
    Níc, bródi. Eu nem tenho o que dizer. Cada dia que passa, cada vez que a gente se vê, a gente estreita mais a nossa relação e tem momentos que eu posso jurar que somos a mesma pessoa. Papai e mamãe criaram a melhor parceria da face da terra. Não tem irmão igual a gente, não tem amor que chegue perto disso. Obrigada por ser meu melhor amigo de todos os tempos, por manter meus pés no chão quando meu coração começa a voar, pelos conselhos e por todas as vezes em que fui uma maluca e não recebi julgamento algum de você, só amor, carinho e atenção. Obrigada por ser a metade de mim que mais me completa. Eu não faço a menor ideia do que faria sem você, eu rezo todo dia pra você ficar bem e ser muito feliz. 'Cê não tem ideia do ser humano maravilhoso de lindo que você é. Te amo infinitamente.
    Aos ex-namorados, paixões avassaladoras, crushs, casos e todos os meus relacionamentos que deram certo, errado ou que não deram em nada. Obrigada pelo aprendizado, pelos ralados no joelho que fizeram de mim mais casca-grossa, pelo carinho que foi me oferecido mesmo que por curtos períodos. Obrigada pela adrenalina que correu no meu sangue e pelo frio na barriga. Pelos beijinhos na testa ou pela pegação pesada nos muros das cidades. Parece bobeira, mas vocês também fazem parte de quem eu sou e cada um fez o que pôde para me dar o que eu queria, ainda que não pudesse dar tudo. Peço perdão pelas vezes que fui louca, grossa e fiquei fora de mim. Vocês nunca tiveram a obrigação de abraçar minha insanidade, infelizmente ela vem no pacote.
    Por fim eu agradeço às inúmeras famílias das quais faço parte: faculdade, trabalho, a dupla,  agregações de círculos sociais de pessoas próximas, pessoas que frequentam as minhas três casas, pessoas que fazem a vida de quem amo mais feliz. Meu coração também derrete igual manteiguinha por vocês.
    Um dia eu vou partir para outro plano espiritual ou para debaixo da terra mesmo, mas hoje eu deixo aqui registrado que até agora, mesmo com todas as dificuldades, a minha vida é maravilhosa e eu estou cercada de pessoas lindas. O aniversário é meu, mas sou eu que devo a você presentes para vida toda. Obrigada por tornarem a minha existência menos pesada e a minha vida mais feliz. Amo vocês.

Najla Brandão

terça-feira, 9 de maio de 2017

Fluxo



    Não represo mais. 
     É estranho dizer isso. A natureza do meu próprio ser é guardar, acumular, juntar e manter a posse das coisas, das pessoas. Eu parei de represar. Deixei o rio seguir seu próprio fluxo para gentilmente tocar a superfície borbulhante da água que corre, mas que não protesta contra meus dedos fazendo com que eu me sinta cansada de segurar.
     Eu deixo ir e deixo estar. Sinto sua falta, não me lembro do seu cheiro mais, nem do encaixe do teu corpo no meu. Não consigo me recordar de muita coisa. Lembro dos seus olhos que somem quando o sorriso é sincero e afunda em covinhas esculpidas com todo o esmero do mundo, lembro da risada que ecoa baixinha num tom meio rouco e bobo. Lembro de me sentir estupidamente apaixonada e bem querida em braços que mal mal me tocaram meia dúzia de vezes. Ainda que pareçam lembranças excessivamente longínquas, posso sentir o hálito delas no meu pescoço quando me esforço para lembrar.
      Te deixo ir e te deixo estar. Não da maneira permissiva como quem pede autorização. Eu deixo no sentido de soltar sua mão pra você conquistar o mundo e mais trezentos milhões de corações e sorrisos. Eu te empurro pro mundo sem deitar na cama e rezar para você voltar. Eu só deixo. Vai, rapaz. Não existe nada no mundo que eu possa te oferecer a mais se eu te segurar pelo colarinho. Eu medito na esperança de manter esse meu sentimento silencioso e baixinho: vai lá ser feliz. Tu abre e fecha a porta quando quer e quantas vezes quiser, por que eu não a tranco e não tenho chave para te dar. Se quiser morar em mim, é só vir e deitar a cabeça no meu colo. Sei que cê vai roncar, mas eu não ligo muito. Juro. 
      Não se assusta. Pode ser que daqui pra frente eu escreva muito ou nunca mais escreva mais nada. É tudo absurdamente novo para mim. Eu observo em um plano americano de cinema a cena mais aguardada do filme: a mocinha se apaixonando pelo mocinho. São uns 200 frames que duram uns seis meses. É o longa-metragem mais longo do mundo. Cada dia um quadro diferente que parece ser idêntico ao anterior. Mas hoje é uma mão que se abaixa um milímetro a mais, amanhã é um pedacinho a mais que você se expôs, daqui duas semanas é um pedaço inexplorado de terra que eu ainda não vi,  por onde podem morar dores e amores. 
      Eu não me perdi. Eu não encontro destino onde existe coincidência. Eu não enxergo amor onde mora carinho. Eu não invento palavras e sentimentos que não saíram da sua boca. Eu não forço que você se interesse pela minha vida, meus pensamentos, minhas loucuras ou meus textos ruins. O melhor texto que escrevi ainda continua sendo sobre um amor platônico de eras jurássicas da minha vida. O melhor beijo da minha vida continua sendo de um amigo gay e o mérito de melhor química do universo e conjunto da obra é seu. Obrigada pela sobriedade, sua sensatez faz parte do que me fez derreter pelos seus encantos. 
     Não me promete nada. Eu não quero promessas para além das que já tenho firmadas contigo. Mas eu me atrevo a pedir com muito carinho. Cuida desses corações que você coleciona. Não deixa cair no chão, nem arranhar nenhum deles. Eu vou aqui tomando conta do meu pra se um dia você quiser, eu te entregar ele lustrado e inteiro e receber em troca o seu.

Najla Brandão
     



Ela é o grande amor da sua vida




     Ela passou por você. Foi a menos de 2 metros de onde você tinha sentado pra assistir o jogo. Ela passou, você tava de costas e não viu. Cê não sabia ainda, mas ela era o amor da sua vida.
Ela continuou caminhando por estar atrasada, tinha combinado de sair com um amigo para tomar uma cerveja no bar da esquina debaixo.
     Tava atrasada por que tinha discutido com o ex pelo telefone, ele queria voltar, ela não e estava cansada desses joguinhos infantis de morde e assopra. No mesmo instante, você estava fazendo um escarcéu de drama sobre como ia terminar sozinho e morando debaixo da ponte se seus amigos continuassem pegando todo o seu dinheiro emprestado. Ela detesta drama. Mas você não sabe disso, pois não a conheceu ainda. Vocês estão em bares diferentes, fazendo coisas diferentes, com pessoas que não se conhecem.
     Em algum momento no fim da noite vocês se esbarram. Ela não derruba nada no chão, você não para pra ajudar. Na verdade seus olhares se cruzam pela primeira vez e ali surge aquela faísca de atração física. Vocês são bonitos e reconhecem isso um no outro. Você faz uma piada ruim, ela sorri e pede desculpas mais uma vez pela situação incômoda. A vida segue.
     Você pega o carro e dirige para a casa da sua namorada, onde você vai fazer um omelete pra vocês dois e depois dormir.  A garota desastrada vai para casa a pé, anda os dois quarteirões de distância brincando com os cachorros da rua e entra em casa exausta, como se tivesse tido o dia mais cansativo do mundo.
Vocês não trocaram números ou nomes. Vocês não sabem nada um do outro. Mas ela gosta de azeitona e você de palmito e reza a lenda que essa é a combinação de um casal perfeito. Ocasionalmente vocês se encontram, o mundo é um lugar muito pequeno. É num outro bar. Vocês vão pegar cerveja no balcão e se reconhecem. Você terminou seu namoro por rotina ou por que sua namorada te trocou por um mais bonitão e mais rico pela quinta vez na sua vida.  Ela só ta ali seguindo o fluxo da vida.
     Vocês se sentam juntos. Ela não fala muito sobre ela. Você não fala muito sobre você. Nas conversas vazias vocês jogam teorias conspiratórias e títulos de filmes fracassados. Ela não sabe ainda, mas você passou por duas ou três barras pesadas nos últimos anos. Você não sabe ainda, mas ela também. Na verdade, vocês nunca vão conversar sobre isso porque é se expor demais.
     Números trocados, vocês conversam todos os dias. Nada de muito importante e profundo. É uma conversa leve e fácil de se levar. Vocês não sabem o motivo, mas sentem que existe algo de grande ali, mas que não vem à superfície. Bobagem, não existe predestinação e amor pra vida inteira.
Vocês saem de novo. Vocês se beijam. Ali rola a maior sinastria sexual e íntima nunca antes vista pela humanidade. De novo, isso de grande amor da vida é balela. De repente, passam a ter medo do que nisso pode dar. Começam os gelos, a distância estabelece um perímetro de segurança, tudo passa a ser mecânico.
     Você conhece outra garota. Ela é engraçada, divertida e tem tudo a ver com você. Vocês gostam do mesmo filme, ela mora no mesmo bairro, ela tem um beijo muito bom. Você  tenta contar pra ela sobre aquelas duas ou três barras pesadas que ce enterrou no peito. Ela não entende. Você finge que tá tudo bem. Não é importante. A nova garota é o amor da sua vida.
     Voltemos à desastrada. Ela não entendeu o que aconteceu, mas também não perde tempo pensando nisso. Tem umas duas ou três barras pesadas na própria vida que vez ou outra volta a atormentar ela. O ex ligou de novo e ela mandou ele ir à merda. Deu de ombros para o que você estava pensando, no fim das contas foi mais um pra conta de possíveis relacionamentos promissores. Sorte dela que mantém as expectativas abaixo de zero.
     Mas ela era o amor da sua vida. E você deixou ela passar por você. Ce não sabe disso ainda e talvez nunca saiba. Ela era tudo. Ela ia virar seu mundo de cabeça pra baixo. Ia fazer você sentir o que nunca sentiu antes. De repente você poderia ter 15 anos de novo, um mundo de espinhas na cara e um peito que praticamente explode toda vez que você lembra dela.
     Hoje ela passou de novo a dois metros de você. Você tava com outra. Ela não viu e tava indo encontrar outro cara mais rico e mais bonito. Atrasada de novo. Pensando no tanto que aquele novo relacionamento parece promissor. Mas eu juro, juro de pé junto, que ela é o grande amor da sua vida. Cê só não sabe disso ainda.

Najla Brandão

segunda-feira, 10 de abril de 2017

Quando não fomos nós dois



     Suspiro. Cá estou novamente encarando as palavras e as letras, como se ao mesmo tempo que tirasse um peso de minhas costas, acrescentasse também uma verdade dentro do peito. Entre os meus livros que ensinam técnica e teoria de relacionamento com a mídia e sabedoria e compaixão no cotidiano, eu posso afirmar com segurança uma coisa: não me ensinaram a lidar com relacionamentos. Tampouco a sabedoria e compaixão que tenho aprendido tem aplicação prática no meu cotidiano caótico. De que me adianta meditar duas horas por dia se não sai da minha cabeça a possibilidade que pisca incessantemente diante dos meus olhos de que nós não somos nada. 

     Estou obcecada. Predadora que sou, é inato de mim repensar seus movimentos e calcular friamente todas as chances que tenho de ser devorada pelos seus clubismos infantis. Minto quando insisto que não houve alterações do clima-tempo emocional. Minha cabeça explodiu em milhões de fragmentos sobre tudo que tive que passar nas últimas semanas e meu coração acelera e congela quando penso no que poderia ter sido de mim. Foi tanta coisa. Morte, renascimento, vida. Coisas cresceram e morreram dentro de mim em todos os sentidos possíveis. Agora me resta isso: cacos do que pode(ria) ser da gente.
     Que loucura, não? Um dia a gente tá planejando como vai ser o dia e no outro como vai ser a vida toda. Não me entenda mal, eu não acredito de forma alguma em qualquer futuro que envolve sua cara de ressaca e meu cabelo manchado de cobre. Isso não é uma realidade. Escrever isso aqui só confirma minhas suspeitas. Acabou o que sequer teve princípio. Eu coloquei o pé na roça, eu bebi a cerveja gelada, eu fumei vapor sem nicotina e tive consciência absoluta e atenta de que aquela vida que eu vivia pertencia única e somente à mim. Ninguém quer me domar, ninguém pode me domar, ninguém vai me domar. A minha sina é solitária, é vazia e instrospectiva.
      Ainda sim, com todas as certezas dentro de mim, meu coração vai vacilar comigo e esquecer de bater quando eu por meus olhos em você. Eu me sinto pequena, logo eu, que tenho em mim um coração agigantado, uma alma gorda, um espírito infinito. Encaro meu reflexo e vejo um corpo que não é compatível com meu ser, vivo uma vida que não compete meus desejos, tenho nos braços marcas de quando fui cem por cento de mim e já não cabia mais em quem eu vivo. 
     Não compreendo minha necessidade em escrever. Minha mente vaga pelas ruas, pelos passados, pelos prováveis futuros, pelo presente que insiste em me atormentar. Tenho mãos que me traem e pedem socorro para o zodíaco, tarô, umbanda, bênção, igrejas, terreiros, centros, templos e o refúgio que não deveria sequer ser um: o que há dentro de mim.
     Perdoa a falta de jeito com as palavras, me desculpe por ter um péssimo timing e eu sinto muito por não confiar em mais nada vindo de ti, mas nós dois sabemos que no fim das contas eu tenho um pouco de razão. A gente sabe também que pra lidar comigo, só sendo outro de mim. E quando a gente se abraçou, a gente prometeu reencontro, mas tava na cara que aquela ali foi a despedida mais triste do mundo.
     Olha, acho que o que eu queria dizer é isso. A gente pariu e viveu um amor lindo, foi completo de inúmeras maneiras, teve tristeza, teve carinho, teve alegria. A minha parte favorita foi comprar aquela casa pré-moldada de madeira para colocar no lote velho com um monte de bichinhos diferentes. Nessa parte você não tava lá de verdade, mas eu gosto de pensar que tava sim. Gosto de trocar nossas crianças por alguns cachorros extras. Isso tudo durou uma fração de segundo. Foi lindo de viver mesmo assim. Mas agora acabou e 'cê volta pra caixinha com os outros 2 ou 3 que também foram amores não vividos. Não tem problema. O carinho continua. 
     Não esquece que eu vou continuar cantando aquelas modas bobas pra você. Se apaixone, namore uma pessoa que seja uma livro em branco e construa coisas. Eu vou continuar aqui na madeira de demolição. Acredita que ontem mesmo vi um pedaço de arueira que dava pra uma viga maravilhosa? Enfim, se cuida e continua. Eu fico do lado de cá com o pé no chão.

Te gosto, rapaz, mas não aprendi ainda a viver em menor intensidade.

Najla Brandão